Amphisbaena spurrelli é uma espécie bastante rara e pouco conhecida de anfisbena. Foi descrita pela primeira vez em 1915 pelo cientista George Boulenger, em homenagem a Herbert Spurrell, um médico e zoólogo que coletou dois exemplares na Colômbia e os levou ao Museu Britânico, na Inglaterra, sua terra natal.
Outros três exemplares foram encontrados nas décadas seguintes na Colômbia e no Panamá, e a espécie ganhou uma redescrição em 1962. Desde então, a única novidade de relevância sobre a Amphisbaena spurrelli foi um novo registro no Panamá, divulgado pela União Internacional para Conservação da Natureza (IUCN), sem muitos detalhes. Dada a escassez de informações, a espécie é considerada "deficiente de dados" (DD) pela IUCN. Isso quer dizer que há tão pouca informação sobre este bicho que não dá para dizer que está ameaçado de extinção, mas também não dá para afirmar que não esteja correndo risco de sumir do mapa. E isso não é exclusividade da Amphisbaena spurrelli, pois pesquisadores estimaram em 2013 que 21% de todos os répteis do planeta são "DD" e, por isso, merecem a atenção de nós mesmos, cientistas. E é aí que eu entrei na estória. Em 2019, enquanto eu estava no pós-doutorado pela UFV (Universidade Federal de Viçosa), recebi financiamento de dois museus dos EUA, o American Museum of Natural History em Nova Iorque e o Field Museum em Chicago. Fui para lá especialmente para examinar anfisbênias das coleções desses museus. E, lá no American Museum me deparei com uma Amphisbaena spurrelli que havia sido coletada em 1976 no Panamá e jamais havia sido citada na literatura científica. Tendo acesso às fotos dos dois exemplares depositados no Museu Britânico e examinando pessoalmente os outros três exemplares que já eram conhecidos da espécie (e que estão em museus dos EUA) não restava dúvida de que eu tinha em mãos um "novo" exemplar de A. spurrelli. Seu local de coleta preenche uma lacuna de 210 km entre as duas localidades para onde a espécie é conhecida no Panamá. E ainda há uma enorme lacuna sem registros entre as localidades panamenhas e colombianas. Mas, tudo indica que isso é devido à escassez de pesquisas na região. O novo estudo acaba de ser publicado na revista científica Phyllomedusa: Journal of Herpetology. Parece pouco, mas mais um pontinho no mapa de registros de espécies raras como Amphisbaena spurrelli nos ajudam a combater lacunas sérias de informações que podem impactar negativamente medidas de conservação. É mais um tijolinho na construção do conhecimento científico.
"Novo" exemplar de Amphisbaena spurrelli coletado em uma floresta inundada em 1976, na região do rio Majecito, Panamá. O animal mede cerca de 25 cm de comprimento total.
Mapa com os pontos de registro de Amphisbaena spurrelli. O novo registro está em vermelho.
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AutorHenrique C. Costa Histórico
January 2024
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